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Instituição financeira é condenada por cobrar juros de 987% ao ano

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Taxas de juros podem ser revisadas em situações excepcionais, contanto que haja relação de consumo, e que fique demonstrado, sem espaço para dúvidas, que as taxas originais são abusivas, capazes de colocar o consumidor em desvantagem exagerada.

Com base nesse entendimento, a 20ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo condenou uma instituição financeira pela cobrança de juros remuneratórios abusivos. O colegiado ainda determinou o recálculo de uma dívida, substituindo a taxa contratada pela média de mercado divulgada pelo Banco Central.

O caso envolve um contrato de empréstimo pessoal, assinado em 2014, no valor de R$ 1.749,80, a ser resgatado em quatro parcelas fixas e consecutivas de R$ 791,14. Ao Judiciário, a cliente pediu o reconhecimento da ilicitude das taxas de juros exigidas no contrato, de 987,22% ao ano, muito superiores à média de mercado.

Em primeira instância, o processo foi extinto, sem julgamento de mérito, ante o reconhecimento da prática de advocacia predatória. O juízo condenou a autora e seu advogado, solidariamente, ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios fixados em R$ 3 mil, multa por litigância de má-fé de R$ 5 mil, sem gratuidade judiciária, além de indenização por danos morais presumidos de R$ 20 mil.

Por unanimidade, o TJ-SP acolheu parte do recurso da cliente e reformou a sentença. O relator, desembargador Alexandre David Malfatti, não verificou uso abusivo do Poder Judiciário por parte do advogado da autora, nem irregularidade na procuração outorgada. Ele destacou que a petição inicial foi individualizada e instruída com documentos, além da realização de audiência de conciliação.

“Ficam afastadas as condenações da parte e do advogado por litigância de má-fé e por indenização dos danos morais. Como salientado anteriormente, não se verificou abuso do direito de ação. E também não se identificou fundamento adequado para condenação do advogado nas sanções pela litigância de má-fé e por danos morais. Aliás, para reparação dos danos morais exigia-se inclusive ação própria para discutir a suposta conduta ilícita do advogado”, afirmou.

Assim, Malfatti afastou a extinção do feito e o julgou parcialmente procedente. Em relação aos juros remuneratórios previstos no contrato, o magistrado observou que a informação clara e precisa é princípio basilar nas relações de consumo (artigo 4°, inciso IV, do CDC) e direito fundamental do consumidor (artigo 6°, inciso III, do CDC).

“Para que o consumidor se vincule às obrigações previstas no contrato não basta que ele tenha conhecimento prévio do conteúdo do contrato mas, sobretudo, que ele compreenda perfeitamente o sentido e o alcance de suas cláusulas, caso contrário, o contrato será inexistente (plano da existência) ou a cláusula será considerada nula (plano da validade).”

Conforme o relator, o fornecedor de serviços de crédito e financiamento deve informar prévia e adequadamente o consumidor sobre o preço do produto ou serviço em moeda corrente nacional, o montante dos juros de mora e da taxa efetiva anual de juros, os acréscimos legalmente previstos, o número e a periodicidade das prestações, e a soma total a pagar, com e sem financiamento.

“Assim, caso porventura incidam encargos financeiros sobre o saldo devedor sem que exista expressa previsão contratual ou constem no instrumento de forma mascarada, disfarçada e dúbia, impossibilitando que o consumidor tenha conhecimento e compreensão clara, precisa e adequada, tem-se que tais encargos não o vinculam, ou seja, são havidos como não pactuados, nos termos do artigo 46, caput, do CDC”, disse.

No caso em análise, segundo Malfatti, a cliente indicou na inicial as taxas de juros disponíveis no site do Banco Central, na modalidade crédito pessoal não consignado, hipótese dos autos, destacando, ao final, que a média de juros praticada no mercado naquele período e para aquela mesma modalidade de contrato foi de 103,58% ao ano.

O desembargador disse que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já considerou abusivas taxas de juros superiores a uma vez e meia, ao dobro ou ao triplo da média praticada pelo mercado no período da contratação. Assim, ele ordenou que os juros contratados no caso dos autos sejam substituídos pela taxa média de mercado.

“Levando-se em consideração os critérios supramencionados, inarredável a conclusão de que os juros praticados pela apelada, de 987,22% ano, são abusivos, uma vez que equivalentes a aproximadamente quase o nônuplo da média de mercado em relação à taxa anual, em contratos da espécie e para o mesmo período de contratação”, explicou. 

Devolução de valores pagos a mais e dano moral
Conforme a decisão, a restituição de eventuais valores pagos a mais pela autora deverá ser feita de forma simples, pois o magistrado considerou configurada a hipótese de engano justificável.

“As questões concernentes à limitação dos juros remuneratórios, capitalização mensal dos juros, comissão de permanência e tarifas bancárias sempre foram alvo de acirrada discussão judicial, não havendo unanimidade acerca da matéria”, disse Malfatti.

Por fim, o desembargador também negou a condenação da instituição financeira ao pagamento de indenização por danos morais, por não ter identificado violação aos direitos da personalidade da cliente. 

“Até o reconhecimento judicial da abusividade da taxa de juros, a apelada esteve escudada na crença de que seu comportamento de que a cobrança dos juros regularmente pactuados decorreu do próprio fato de existir previsão contratual, o que configura engano justificável, afastando, assim, o dolo ou a má-fé da cobrança”, finalizou.

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Processo 1007042-69.2021.8.26.0189

Fonte: Tábata Viapiana é repórter da revista Consultor Jurídico.
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